domingo, 1 de fevereiro de 2009

Telmo, o marujo

Uma visita à Ilha do Labor (1ª parte)

O tempo passava numa rotina que me propiciava a aprendizagem da cultura daquele povo. Aprendi a usar a minha linguagem do pensamento, as regras e atitudes a tomar com os Seguidores da Casa.
Apesar de todos me ajudarem a responder às minhas dúvidas, gostava de estar sempre que possível com Helena e Irene. A primeira tornava a minha estada alegre e agradável, supria as minhas necessidades humanas e despertava-me o interesse pela aventura. A outra era sem dúvida uma mãe, sempre pronta a acarinhar-me e a ouvir os meus mais secretos sentimentos.
Era, o que se pode dizer, um rapaz feliz!
Uma manhã, Irene veio despertar-me com um sorriso no rosto:
- Quero convidar-te a vires comigo à Ilha do Labor.
Saltei rapidamente da cama e quando me preparava para vestir a roupa habitual ela entregou-me uma outra. Tratava-se de umas calças mais compridas cor de rato e uma túnica de um cinzento mais claro. Também me deu uma capa de feltro vermelho com um capuz. Calcei, pela primeira vez em muito tempo, uma botas grossas que me davam quase até ao joelho. Ela mesma trazia roupa muito mais quente e explicou-me que o clima da Ilha do Labor era muito húmido e bastante mais fresco.
Helena apareceu e trouxe-me um almoço mais consistente avisando-me que tomasse muita atenção aos acontecimentos desse dia porque eles seriam de grande utilidade no futuro.
Despedi-me dela e fui de mão dada com Irene à visita.
Primeiro descemos a rampa que nos levou à estrada marginal e seguimos por ela até à ponte que ligava as duas ilhas. O mar nesse dia estava rosa claro, quase branco e muito sereno.
A ponte era de pedra alaranjada, comprida, apoiada em nove arcos. Suficientemente larga para deixar cruzar dois carros e gente de um lado e do outro. À medida que avançávamos, apercebia-se da diferença de temperatura, mergulhávamos num nevoeiro amarelento que me arrepiou porque já não estava habituado. Lá em baixo, no mar, conseguia entrever as silhuetas de embarcações que navegavam em diversas direcções. Só quando nos aproximámos do final e deixamos para trás o nevoeiro é que pude divisar a Ilha.
Era toda constituída por outeiros e colinas, fazia lembrar ondas do mar com os pássaros marinhos que guinchavam enquanto cruzavam os ares.
Ao chegarmos, sofri um choque! Uma intensa mistura de odores atingiu-me de repente: Era cheiro a fruta, a peixe, hortaliças, a barro molhado e curiosamente, a gente. Espirrei uma dúzia de vezes e Irene olhava para mim e ria-se… ria e dizia: “- Estás a ficar muito sensível!”
O primeiro lugar onde parámos foi a feira. Havia tanto movimento e ruído que fiquei meio tonto. Eram centenas de homens e mulheres andando atarefadamente, vendendo e comprando. Comercializava-se de tudo. Desde produtos hortícolas, gado miúdo, artefactos, panos, enfim, tudo o que era necessário para viver com todo o conforto.
Naturalmente, parei junto de uma tenda de panos para apreciar a qualidade dos tecidos. Irene, olhou-me compreensiva mas depois puxou-me pela mão e levou-me até ao lugar onde se vendiam cabras e ovelhas. Perguntou a um dos vendedores por Naomi. O homem encolheu os ombros e disse que talvez fosse melhor perguntar ao vendedor de mantas. Em ziguezague percorremos mais uns caminhos e chegámos até lá.
Foi uma mulher que respondeu a Irene. Pô-la ao corrente da doença de Naomi, e acrescentou que devia estar tão mal que os filhos nem vinham ao mercado há mais de dois dias. Rematou a conversa com um: “- Naomi já viveu tanto!”
Irene agradeceu e saiu dali com um ar preocupado. Estugou o passo e enfiou por um carreiro que se dirigia ao interior da ilha.
Mais ao menos a meio cortou por uma azinhaga e aproximámo-nos da aldeia onde Naomi morava. Eu francamente já estava cansado embora não quisesse dar parte de fraco. Mas Irene percebeu pelo meu arrastar de passos, o meu constante parar para observar os campos ou os rebanhos que pastavam neles. Por isso me olhou com ternura e me disse:”-Já estamos a chegar, pequenote.” Envergonhei-me e acelerei o passo para a acompanhar.

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