terça-feira, 6 de janeiro de 2009

Do livro projecto: "Porque te falo assim!"

Ah! Será que o vento entende a minha linguagem?
Se assim fosse, eu e ele trocaríamos mágoas. Sim, espalharíamos audíveis os rumores da nossa tristeza!
Bem as sinto, as palavras dele, fustigando-me a pele, porque a deixam vermelha, arrepiada…mas, o que dizem elas? Não há dicionário, nem gramática para a língua dos elementos!
Quando lanço as minhas, fico expectante e, espero que sendo ele tão viajado, mas possa compreender e responder. Mas não, continua imperturbável no seu soprar!
O vento é louco. Louquinho de todo! Incapaz de serenar, de reflectir no que ouve.
No outro dia, junto ao desmaio das ondas de uma praia escondida, em pé, enterrada na areia empapada, gritei:
-Eh vento! Escuta a minha dor que não sossega, que me fere a alma como uma lâmina, que remexe nas minhas feridas que nunca cicatrizaram e que alastram para aquém de mim!
A princípio pareceu ouvir-me porque amainou um poucochinho, ficou quase brisa. Depois, numa fúria leviana, arrancou de mim as crostas e expôs-me ainda mais viva ao sofrimento.
Foi nessa altura que tomei resolutamente a decisão de mergulhar-me inteira nas águas saturadas de lágrimas que é o mar. Nem sequer lhe pedi licença! Foi um impulso. Coisa que poucas vezes me acontece porque sou uma mulher adulta absolutamente controlada e, não costumo fazer disparates!
O frio que senti fez-me bem. Acordou-me a alma num arrepio, depois, nadei no sentido inverso ao desmancho das ondas e deixei-me boiar, embalada por elas.
Enquanto me perdia, ouvi soluços longínquos, gemidos abafados, suspiros tímidos, abri os olhos e não ouvi ninguém por perto, estava completamente só naquele espaço limitado apenas pelas rochas e o areal. Voltei a fechar os olhos e a ouvir os lamentos. Desta vez tinha a certeza, ouvia-os distintamente, bem sonoros, e cada vez mais insistentes.
Incomodada, voltei para terra, sacudi o corpo e deixei-me cair na areia Que já queimava debaixo do sol do meio-dia. Pensei que estava sob o domínio de alucinações, na verdade o meu estado de espírito tem andado inquieto, ultimamente, mas daí a ver ou ouvir coisas, vai uma diferença enorme! Mas…tudo me parecera tão real, tão próximo! De repente senti-me esquisita, reparei que cá fora tudo estava imóvel. Tudo, não, embora as ondas, as aves, as folhas dos cactos que nascem nas dunas, a bandeira verde que encimava o mastro, estivessem imotos, eu…eu é que planava acima do universo levada por uma brisa mansa e, fora assim, que eu colhera as vozes do mundo, como ele costuma fazer…
Compreendi então que era esta a resposta do vento !

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