E Ela disse...
Os homens começavam agora a sua aventura terrena. Tinham compreendido que tudo passara a ser perecível para renascer depois mais preenchido e mais completo.
Olharam-se e, depois de breves instantes de observação, detectaram alguns pequenos defeitos que os tornavam frágeis.
Descobriram que qualquer ser era formado de duas partes por isso desejaram eles mesmos serem criadores de um novo ser.
O homem encarou a mulher e com os seus olhos percorreu todo o seu corpo.
Desejou que o novo ser tivesse o olhar dela, puro, meigo, eloquente. Desejou ainda que ele tivesse o seu nariz, a sua boca, o seu rosto!
A mulher enlevada no seu homem suspirou e pensou:
- Ah se o novo ser fosse idêntico ao meu homem! Se tivesse o seu corpo forte e as suas mãos macias!
O homem e a mulher fizeram então os seus corpos e as suas almas encontrarem-se num ritual de dança e de alegria, de ansiedade e de desejo.
E esperaram...
O corpo da mulher foi se enchendo de vida, tornando-se redondo e largo.
O homem via-a e, espantado, não atinava como era possível que o ser proviesse dela.
Com tal encanto, o homem trazia à mulher todos os dias presentes novos; conchas do mar, borboletas do ar, flores da terra, estrelas do céu. E a mulher alimentava-se deles...
Uma madrugada enquanto o sol chegava e a lua se despedia, nasceu o novo ser.
Era minúsculo, muito longe daquilo que o homem e a mulher pensavam que fosse, cabia na palma da mão do homem, no colo da mulher, mas acima de tudo cabia nos seus corações!
Uma lágrima de emoção escorreu de cada rosto dos pais, essas lágrimas encontraram-se nos lábios do filho que a lambeu sofregamente.
Chamaram Sete, ao misterioso ser, que viera ao mundo.
A sua voz fazia lembrar o som das conchas do mar, os seus gestos assemelhavam-se ao esvoaçar de borboletas, o seu cheiro perfumado parecia o das flores e... e seu olhar tinha o brilho das estrelas do céu!
Então a mulher recordou os presentes do homem e ainda o amou mais!
Sete cresceu. Tornou-se grande e forte como o seu pai, meigo, puro e eloquente como a sua mãe.
Sete tinha uma curiosidade insaciável, uma vontade imensa de conhecer, por isso um dia despedindo-se dos seus pais, rasgou estradas e avançou para o outro lado do mundo.
Percorreu planícies e montanhas, florestas e desertos, ilhas e lagos. Penetrou nevoeiros, protegeu-se dos raios, mergulhou nos oceanos e debruçou-se no limite de muitas ravinas.
Sete crescia por dentro de si mesmo tornando-se maior que seu pai e que sua mãe.
No seu exílio, Sete, aprendeu que o Mundo era grande demais e que nunca o conheceria por inteiro.
O seu orgulho ficou profundamente atingido, pela primeira vez na sua curta vida, revoltou-se contra a existência, gritou muito alto contra ela.
Descobriu que a dor podia nascer dentro de si, sem ser necessário abrir ferida. E, chorou!
A tarde do dia estendia-se já no horizonte quando um vulto feminino, singelo e irreal lhe surgiu. Estava coberto de mil cores fulgurantes e a sua voz soava mais bela que a música.
Com suavidade, sem quaisquer censuras, aquela que lhe falava explicou-lhe que o mundo crescia à medida que o homem crescesse, por isso ele o via cada vez maior.
Desse modo jamais perderia a vontade de ir mais além. Afinal, aquilo que ele julgava ser uma frustração era antes um desafio e estava na sua mão aceitá-lo ou não.
Sete ouvia-a atentamente.
Aos poucos a sua alma foi aclarando e sossegando, era bom aprender com ela!
No final da noite, quando a aurora despontava, Sete pediu-lhe que nunca o deixasse. Ela sorriu, tocou levemente o seu peito com a mão, aproximou-se do seu rosto e beijou-o...
O beijo longo e doce despiu aquele que se chamava Sete e deu-lhe uma nova identidade.
A partir daí toda a sabedoria dele passou ser serena e fecunda. Um velho em corpo de jovem, aliando a experiência à curiosidade, unindo a calma à alegria.
Ela partiu ficando.
Ele deu-lhe o nome de Oito, mas o seu... passou a ser Nove!
Esta foi a última notícia que dela tive.
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